Escapa-me a noção de liberdade reclamada sobre a violência gratuita. O rastro que a população dita livre e civilizada vai largando a reboque desse “direito à resistência”: soa lindamente; principalmente quando o direito à resistência pode ser invocado e exercido em países sem tradição de envenenar, torturar, ou fazer desaparecer os que não estão com o rebanho.
Com algumas excepções (poucas, muito poucas),
a maioria dos argumentos que vou ouvindo de quem se decide pela não vacinação acenando
com o trunfo da “liberdade individual” assemelha-se à “liberdade individual”
daqueles fumadores convictos que, de forma prepotente e muito livre, fumam de
rosto voltado para a mesa do lado, sem qualquer pudor em cuspir o fumo sobre o
alheio. Ou daqueles donos de cães, livres, mas tão livres, que não vergam as
costas para apanhar os cocós dos bichanos, o que seria, fica a liberdade
individual ali mesmo, desde que o ali mesmo seja no caminho dos outros.
Dito isto, não estou completamente certa quanto à linha que podemos ou não podemos cruzar, no que toca às medidas mais adequadas para minimizar a propagação da doença que nos tem (e mantém) reféns há quase dois anos. Isto também a propósito das “sanções” que alguns países começam a impor sobre os seus não vacinados por opção e direito, como a obrigação de suportar os custos de saúde, ou o confinamento individualizado. Tenho muitas dúvidas, e não é por achar comparável – coisa que não acho – com os casos de fumadores a braços com tratamentos contra o cancro, ou dos obesos que esperam anos por uma cirurgia de banda gástrica no SNS, como atiram alguns só para baralhar e esvaziar discussões sérias sobre o assunto. Mas rejeito veementemente uma liberdade forjada sobre a imbecilidade.