quinta-feira, 10 de junho de 2021

Entre as dezenas de livros que fui adquirindo ao longo dos últimos meses (sem incluir na contabilidade os que me foram oferecidos), consta O Latim do Zero, do professor (e et cetera) Frederico Lourenço.

Não vou aprender latim. Nem tentar, suponho. Creio, antes, que sofro da mesma síndrome que Arturo Pérez-Reverte: compro livros que já li, compro aqueles que vou ler e os que nunca lerei; mas preciso que estejam todos ali. Mesmo que a minha biblioteca nem chegue bem a ser bem uma biblioteca: já vou empilhando livros onde posso, com a dignidade possível para ambas as partes, até me ver obrigada a refazer, finalmente, uma obra que ando a adiar há anos. E talvez ainda volte a Pérez-Reverte, a quem gosto mais de ler o que escreve nas crónicas do que o que escreve nos livros, na verdade. Mas isto sou eu, que faço tudo o que dizem que não se faz no que a leituras – e a escrituras – diz respeito. Desde logo, não raras vezes, rabisco os meus livros; sublinho; e, se preciso for, posso encher de gatafunhos o verso dos marcadores mais aquelas cintas elegantíssimas (desde que pouco “enceradas”) que trazem alguns. Até dobro, pasme-se – raramente, é certo –, o canto de algumas páginas. Não vá alguém vir aqui ao engano.

Mas, a propósito de latim. Tinha ouvido falar da página de Facebook de Frederico Lourenço há algum tempo; e, um dia qualquer, o livro saltou de uma estante da Fnac para as minhas mãos. Não sou supersticiosa, mas os tempos andam estranhos. E não tenho Facebook. Adicionei-o à lista.

Às primeiras páginas, a proposta é ambiciosa: “O projeto Latim do Zero propõe 50 lições que, passo a passo, visam dar as bases gramaticais para ler, na língua original, a Eneida de Vergílio – sem sombra de dúvida, a maior obra da literatura latina.” Na língua original. É o que sempre me tenta. Poder ler um autor na sua língua original. Para não ser traída. Nem seduzida pela astúcia inflamada, possivelmente, dos galanteadores. Seria tão bom, se pudesse.

Ainda não cheguei à primeira lição. Ainda estou cheia de ilusões.

Hoje também seria dia de celebrar Portugal e o Poeta, e estive quase, quase a escrever qualquer coisa digna. Depois, tropecei na comunicação de Fernando Medina, a desculpar-se pelo “erro lamentável” de se ter enviado para a Rússia dados pessoais de activistas russos residentes em Portugal, aproveitando para – como vem sendo apanágio de detentores de cargos públicos que se julgam dispensados de prestar contas ao país – acusar a oposição, ou o que, infelizmente, dela resta, de delírio e aproveitamento político. A melhor estratégia para "enfrentar" críticas e fugir às (ir)responsabilidades é encenar indignações apopléticas. Ninguém tem o exclusivo, PS, PSD, o que seja. E, de repente, tudo o que se me oferecia dizer talvez não caiba neste espaço, que, apesar de tudo, ainda tenta manter o mínimo de compostura. De modo que, achei por bem calar-me. Mais ou menos. Decididamente, é urgente distinguir Portugal dos portugueses. Destes. Dos de p pequenino. Minúsculos.

Mas tenho um exemplar belíssimo, antiquíssimo, de Os Lusíadas. De vez em quando, retiro-o do seu refúgio. Com esforço. É um livro grande e pesado, os Cantos inaugurados em ilustrações magníficas. Sinto-lhe o cheiro dos anos, as pregas do tempo e da História. Obviamente, não o rabisco. Nem lhe dobro os cantos das páginas. Adoro-o como merece.