segunda-feira, 7 de agosto de 2023

Este calor deixa-me enjoada. É-me insuportável. A minha tensão arterial é incompatível com o calor tórrido de Agosto. Com o calor tórrido, seja qual for o mês. Diz a minha mãe que estou que não posso com um gato pelo rabo, como se pegar num gato pelo rabo fosse coisa fácil de se fazer, mesmo sem o calor de Agosto e sem uma tensão arterial moribunda. Um exagero. Estou que não posso com o rabo, mesmo que não traga o gato apenso. Nem sei se aquilo é coisa que se diga agora, ai ai ai, mãe, fui procurar a origem do dito, por curiosidade e aborrecimento, e dei com uma série de recomendações alarmadas sobre não maltratar os bichos, enfim, para que conste, todos os animais da família são principescamente tratados. O meu corrector ortográfico diz que não se diz principescamente.

Não interessa nada.

As Jornadas Mundiais da Juventude foram um sucesso, e ainda bem. Se a coisa se fez, ainda bem que se fez bem. Vi aquelas imagens do parque Tejo, perto dos 40 ºC, dizia-se, um milhão e meio de gente horas e horas ao sol para ver e ouvir o Papa Francisco, e eram imagens impressionantes. Eu gosto daquele homem, já disse. Independentemente da Igreja ou da Fé, das virtudes ou dos vícios. Não me revejo em tudo o que faz a mensagem de Francisco, sou demasiado pecadora, mas admiro profundamente a sua capacidade em fazê-la chegar, a não desistência, pela palavra e pelos actos. Há dias, numa edição do “Toda a Verdade” varrendo alguns momentos mais marcantes do pontificado e da mensagem de Francisco, uma freira argentina dizia dele: “A sua própria vida é um sermão”. E é. Para seguir ou não, porque, como também aí dizia o Papa Francisco, somos livres até para não amar a Deus. Chamam-lhe herege não por acaso.

Também somos livres para criticar tudo isto, e tudo o resto à volta disto; inclusive o concubinato entre o Estado e a Igreja, embora, suponho, o estado de graça e adoração que Portugal viveu nos últimos seis dias se deva mais a este Papa do que à sua Igreja.


Espero regressar em Setembro.


quarta-feira, 2 de agosto de 2023

Mandava o bom senso que visse coisas alegres, agora que tenho tempo para ver televisão, mas não calhou. O que calhou foi ver em dias seguidos “Os Miseráveis”, do realizador Ladj Ly, e “O Pianista”, de Roman Polanski. E dois ou três dias depois, a mini-série norueguesa “O Marinheiro de Guerra", de Gunnar Vikene. Três produções extraordinárias.


Laico, ma non troppo

O meu sobrinho tinha quatro anos quando os médicos suspeitaram de um pequeno tumor no seu ouvido esquerdo. Numa dor só sua, numa fé só sua, o meu Pai fez uma promessa a Nossa Senhora de Fátima.

Devo dizer que o meu Pai tem a pior opinião da Igreja enquanto organização, não põe os pés numa missa, e, salvo honoráveis e raríssimas excepçoes, não gosta de padres. Sobre os abusos sobre crianças, sobre os abusos sexuais de crianças na Igreja Católica, ou, mais exactamente, sobre os castigos e penas a aplicar aos patifes, mais ainda se os patifes forem sacerdotes, o meu Pai tem uma posição muito pouco católica. Mas há um entendimento qualquer entre si e aquela Maria de Jesus; uma coisa só deles. Sempre que lhe fica em caminho, pára em Fátima e acende-lhe treze velas. Cada uma das velas tem um significado e um propósito, e talvez tenham chegado a ser treze por acaso, mas 13 é o número preferido do meu Pai. Só para lhe fazer a vontade, desconfio, o meu filho, neto mais velho, nasceu às 13:13 h de um dia de Dezembro.

Não sei bem o que é isso de ter fé. Rezo (nem sei se é um rezo) por coisas pequenas, pouco meritórias, para ocupar a mente quando preciso de me acalmar, mais habituação do que devoção, como no outro dia, em que fiquei presa trinta e dois longos minutos no elevador do prédio. Suponho que a fé, na sua forma mais pura mais crua e mais bela, seja coisa ao alcance de poucos. Embora não a entenda e não a possua, comove-se a fé dos outros. Nunca serei capaz de pôr por palavras a torrente de emoções daquela época.

Mas o nosso Estado é laico; quando o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa afirma que o país cumpriu um sonho, não foi bem o país: foi o seu Presidente. Marcelo esperou, desejou e conseguiu. Naquela equação, o País foi quase um pormenor.

A falta de fé não me empurra, no entanto, para o coro dos indignados com a deferência que o nosso Estado laico presta ao Papa Francisco nestas Jornadas Mundiais da Juventude – mas eu gosto do homem, mais do que do Papa, e a minha opinião pode não ser isenta. Já a indignação pela utilização de dinheiros públicos e serviços públicos para o evento, parece-me mais do que legítima. É tão absurdo criticar os ateus fervorosos, acusando-os de sentirem ódio contra a Igreja e etc – coisa que está muito na moda, acusar de ódio tudo o que opina contra a nossa vontade –, como defender uma espécie de tréguas no escrutínio aos gastos públicos, ou deixar de questionar sobre o tal retorno económico miraculoso porque a juventude que por aí anda em jornada é alegre e optimista e caleidoscópica. Mas somos sempre mais tolerantes quando a causa nos embevece. Rabugentos são os outros.