Quem
não tem cão caça com gato. E quem vive num país pequeno arranja uma caixinha
jeitosa, com dinheiro a rodos para distribuir entre os amigos e os amigos dos
amigos, comendadores, amigos dos comendadores, gestores competentíssimos
traídos por fracas e selectivas memórias, advogados de grandes sociedades que
se servem, avidamente, das leis que criam com o único e pérfido propósito de
confundir, uma manta esburacada, intencionalmente rota e mutilada para
posterior usufruto de agulhas próprias, onde remendos e restauros se hão-de
pagar a preço de ouro, deixando a nação subjugada, de joelhos, a alguns donos
daquilo tudo.
A
caixa, no entanto, não é para todos. Ou, pelo menos, não da mesma maneira. Uns
têm dívidas, outros imparidades. Uns devem possuir mais do que aquilo que pedem
à banca, outros possuem a arte de extorquir milhões para financiar empreitadas
de reconhecido luxo das quais sugarão o tão cobiçado lucro, se o houver,
declinando, com arrogância e nojo, os prejuízos, essa peçonha viscosa e de
menor casta, a distribuir pelos contribuintes, alguns, os mais incautos,
alheios ao mundo da alta finança, do esbulho chique e sobranceiro, onde
a reconhecida competência mais não é do que um embuste, porque levada ao
colo, sem esforço próprio, a saque, colada a grupos de autênticos mafiosos, a
coberto de um sabujo sistema de interesses articulados para que nunca alguém com
poder vá parar à cadeia, como tão bem disse um conhecido advogado num
também conhecido programa de televisão, não vai assim muito tempo. Deve ser por
isso que alguns se dizem injustiçados, pobres coitados, vítimas de cabalas,
perseguições e chantagens mesquinhas. Afinal, fiaram-se na teia que os
ampararia a todos; na aranha que a urdia com astúcia e paciência. Mas, às
vezes, o abuso torna-se abjecto, pelo que, urge disfarçar o descaramento e é aí
que rolam as cabeças de pífios peões iludidos, os que apenas comiam das
migalhas, sem engenho ou audácia para chegar ao topo, todos engordam do pote,
mas, a alguns, apenas está permitido raspar as bordas e lamber os dedos.
Aos
poderosos não se diz não. Faz-se o que for preciso. E assim se
permitiu que a Caixa-Geral de Depósitos, um banco do Estado, servisse,
antes, de banco privado, uma fonte de recursos que parecia inesgotável para um
grupo de privilegiados, entre os que dela se serviam à vontade e sem-vergonha e
os que tinham o dever de regular sem nada ver até ser impossível continuar a
olhar para o lado.
O
relatório da auditoria
à CGD, de que se tem falado nos últimos dias, devia encher horas e horas de
programas de televisão, de análise, em análise, em análise, como sabemos fazer
tão bem com as importantíssimas questões do futebol, onde cada falta,
cada toque, cada erro de arbitragem, cada espirro inconsequente, dá para
sessões intermináveis, de debate e discussão, de repetição em repetição, ad
nauseam, como se não houvesse nada de mais interesse para o país. Que
miseráveis somos!
Entretanto,
há 17 gestores referidos na auditoria à
CGD que continuam ligados à banca. São
gestores de topo, competentíssimos portanto, presume-se, que foram responsáveis
por decisões de concessão de créditos que originaram perdas, para a CGD, de
perto de três mil milhões de euros. Nada que os contribuintes portugueses não
possam pagar. Afinal, como se sabe, vivemos acima das nossas possibilidades há
muitíssimo tempo.
O
jornal Expresso dá
conta de que foi a CGD que denunciou José Sócrates à Unidade de Informação
Financeira da Polícia Judiciária em Abril de 2013. A denúncia refere a
existência de um possível esquema de transferências de dinheiro desse grande e
abnegado amigo, Carlos Santos Silva, para José Sócrates, por intermédio de uma
conta da mãe deste; uma “conta de passagem”. Vale a pena ler. E é só
mais um pormenor.
Na
verdade, vale a pena ler tudo o que se refere a este caso, ao verdadeiro
assalto à CGD, que já nos obrigou - a todos os que pagamos impostos à custa do
nosso trabalho - a injectar, como se diz, milhões e milhões de euros para evitar
a ruína. Se não se souber por onde começar, "Quem Meteu a Mão na
Caixa", de Helan Garrido é um bom princípio.