quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

(Outr)A Guerra dos Sexos

De polémica em polémica, até que a voz nos doa, ou o teclado derreta. Já nem há novas polémicas, pois que se sucedem abruptamente, definhando sem florir plenamente, atropelando-se, sôfregas, entupindo qualquer espaço de debate, esbofeteando qualquer audácia, um grito a seguir ao outro, já esqueci porque gritei primeiro. Em primeiro.

Agora, homens de barba rija ameaçam boicotar a Gillette. Não parece muito eficaz, eu sei. O trocadilho desastrado. Se têm barba rija, provavelmente, usam pouco ou nada a gillette, pelo que, vivem em boicote permanente no que a barbeados diz respeito. De modo que, restam os que se preocupam em não ter pêlo na venta, pelo menos, desse tipo, e, ainda assim, querem continuar a ser homens. Ou rapazes. Deixem os homens serem homens e os rapazes serem rapazes.

Afinal, o que tem de tão ofensivo o recente anúncio da Gillette que incendiou, outra vez, as redes sociais? Muito homens viram-no como um ataque à sua masculinidade. Sentem-se ofendidos, indignados por muitos motivos, um deles, o facto de o anúncio ter sido realizado por uma mulher. “Let boys be damn boys. Let men be damn men”. O que é ser damn boy, ou damn men? O anúncio chama a atenção para comportamentos abusivos, que não fazem, exactamente, de um rapaz um rapaz, ou de um homem um homem.

Há quem discorde. Quem diga que a agressividade faz parte do pacote (eu sei, mas, tal com há pouco, não me apetece alterar). Na verdade, “os homens são o sexo selvagem, o que explica a sua perigosidade, mas também seu dinamismo”. Mais ainda, “You can’t have male inventiveness, innovation, civilization-building, and lifesaving without the explosive masculine energy that is their impetus, ou seja, as sociedades só poderão evoluir e prosperar se pudermos contar com a explosiva energia masculina, a chave que é o motor eficaz e insubstituível do progresso.

Sou daquelas mulheres que não se acha igual a homem, graças a Deus se for dele a culpa. Há outros que acham o mesmo. A igualdade de oportunidades é uma coisa completamente diferente e acho que é dessa igualdade que devemos tratar. E, dessa, não abdicar, sob nenhum pretexto, por mais descarado, ou por mais ardiloso.

Não me sinto violentamente ultrajada quando um homem me cede a passagem ao entrar no elevador, ou se se oferece para me ajudar a mudar um pneu, coisa que até sei fazer com bastante competência (obrigada ao meu pai, que sempre percebeu bastante das diferenças que verdadeiramente importam), desde que consiga desapertar o raio dos parafusos. Já o meu marido, do mais macho que há, com aquela habilidade desconcertante, e irritante, de se orientar até debaixo de terra, detesta que eu o interrompa no meio de uma tarefa, porque, como é sabido, no que toca a multitasking, o sexo também conta. E tantas, mas tantas, outras diferenças em que nos perdemos e nos encontramos, machos ou fêmeas, homens ou mulheres, ganhando mais do que perdemos se não nos deixarmos aprisionar por toxicidades e extremismos acéfalos que nos diminuem e nos afastam, mais do que o tão almejado, e necessário!, contrário.

Seja como for, a agressividade masculina não tem que resvalar para o abuso, ou para a violência física e, pessoalmente, não vejo no anúncio mais do que o repúdio por isto mesmo. Outros viram para além disso e é, aqui sim, parece-me, um exemplo daquilo a que se chama liberdade de expressão. Se ao menos pudéssemos usá-la sem nos insultarmos a cada clique...