quarta-feira, 2 de março de 2022

Do mundo, para fugir do mundo

“À noite, voltou a chover. Esteve a ouvir o borbulhar da água durante muito tempo; depois deve ter adormecido porque quando acordou já só se ouvia uma chuva miudinha. Os vidros da janela estavam embaciados e, do lado de fora, as gotas resvalavam em fios grossos como lágrimas. “Via cair as gotas iluminadas pelos relâmpagos e, sempre que respirava, suspirava e sempre que pensava, pensava em ti, Susana.”

A chuva transformava-se em brisa. Ouviu: “O perdão dos pecados e a ressurreição da carne. Amén.” Isso era cá dentro, onde as mulheres rezavam o fim do rosário. Levantavam-se; fechavam os pássaros; trancavam a porta; apagavam a luz.

Só permanecia a luz da noite, o ciciar da chuva como um murmúrio de grilos…”

Pedro Páramo

Juan Rulfo