Aqui
onde estou não chegaram poeiras de África. Não se ainda ou se já cá não voltam. Mas soprou um vento vadio
que despiu todos os dentes-de-leão do jardim. O chão cobriu-se de um espantoso manto
branco de neve, de minúsculas plumas serrilhadas, extenso e fofo como um tapete
de algodão. Não se vêem as rendinhas das plumas, obviamente, só daquelas que voaram para dentro do carro assim que abri a porta e que apanhei com a mão. Nunca percebi por que se chama dentes-de-leão aos dentes-de-leão. Diz-se que o rendilhado, mesmo minúsculo, das pequenas cerdas lembra os dentes de um leão, e as
flores amarelas a sua juba farta: não deviam ter nome de coisa frágil, os
dentes-de-leão, tão frágil como as trémulas penas dos pompons brancos que um
pequeno sopro faz esvoaçar em finos fios de lã? Também dizem que há quem lhes
chame amor-dos-homens. Não sei se é suficientemente frágil, só conheci homens
de amores densos, imutáveis. Faltou-me um daqueles amores de Verão que só dura
um Verão. Vou anotar na agenda. Podiam chamar amor-de-Verão aos dentes-de-leão.