quarta-feira, 4 de dezembro de 2024

Maria Teresa Horta

"Desperta-me de noite

o teu desejo

na vaga dos teus dedos

com que vergas

o sono em que me deito

 

pois suspeitas

 

que com ele me visto

e me defendo

É raiva

então ciume

a tua boca

 

é dor e não

queixume

a tua espada

 

é rede a tua língua

em sua teia

 

é vício as palavras

com que falas

 

E tomas-me de foça

não o sendo

e deixo que o meu ventre

se trespasse

 

E queres-me de amor

e dás-me o tempo

 

a trégua

a entrega

e o disfarce

 

Lembras os meus ombros docemente

na dobra do lençol que desfazes

na pressa de teres o que só sentes

e possuíres de mim o que não sabes

 

Despertas-me de noite

com o teu corpo

 

tiras-me do sono

onde resvalo

 

e eu pouco a pouco

vou repelindo a noite

 

e tu dentro de mim

vais descobrindo vales."

As Nossas Madrugadas, Maria Teresa Horta

 


“Minha Senhora de Mim” foi publicado pela primeira vez em 1971. Era precisa muita coragem para ofender daquela maneira a moral tradicional do país, que mantinha a mulher em regime de obediência ao seu papel de esposa e mãe. Assexuada. Maria Teresa Horta talvez prefira que se diga: o que é preciso é Liberdade. Por ela, foi perseguida e espancada. 

Este ano, a BBC incluiu-a na sua lista das 100 mulheres mais influentes e inspiradoras de todo o mundo.

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