Na
terça-feira passada, António Mexia
foi ao Parlamento dizer, entre outras coisas, que, não só não há nada disso de rendas
excessivas na EDP, como a empresa a que preside é o abono de família do Estado.
Ricardo Salgado
deu uma entrevista à
TSF, na qual, como habitualmente, clamou por inocência sua e má vontade dos
outros. Por entre as respostas às habituais perguntas fofinhas que este
tipo de gente sempre inspira aos jornalistas – mesmo os mais prestigiados e
competentes – voltou a dizer que os lesados do BES, em quem o próprio pensa
todos os dias, coitado, são culpa do Banco de Portugal, de Pedro Passos Coelho
e da maldita resolução, e não dos seus actos de gestão.
Entretanto,
o Novo Banco – o tal que era bom – voltou a meter a mão no Fundo de Resolução para arrecadar mais 1,149 mil milhões
euros, coisa pouca, para fazer face à toxicidade
daqueles activos que tombam sempre para o mesmo lado, o do Estado, ou seja, o
do aparentemente amplo e cheio (para alguns) bolso do contribuinte
(eventualmente, de outros bancos que se portaram bem, se é que ainda sobra
algum).
Há
alturas em que se torna difícil expressar indignação com a mesma eloquência com
que somos insultados. Isto, se quisermos manter o nível dois ou três patamares
acima do gozo rasteiro e ordinário e, ao mesmo tempo, não deixar que nos tomem
por parvos. É que, mesmo entre os brandos costumes, deveria haver limites para
o desaforo.
As
comissões parlamentares de inquérito têm servido, em grande parte, para deixar
a nu a descomunal lata de alguns dos seus principais protagonistas.
Nesse sentido, António Mexia não desiludiu. Falou de “demagogia” e
“manipulação” para rejeitar as críticas aos chamados CMEC – custos para a
Manutenção do Equilíbrio Contratual – e as suspeitas que recaem sobre a forma
como esses contratos foram negociados. Para o gestor da EDP, tais contratos não
vieram favorecer a sua, literalmente, empresa. Pelo contrário, até terá perdido
dinheiro na passagem dos CAE (contratos de aquisição de energia) para os CMEC.
Se não fossem os CMEC, as compensações que Estado deve (como não) à empresa
teriam ascendido a muitos mais milhões de euros. O magnífico e competentíssimo
gestor de um gigante monopólio (não sei se a ENDESA chega bem a ser
concorrência) dedicado à distribuição e venda de um bem essencial para o
funcionamento regular de uma sociedade mais ou menos civilizada, está, até,
disponível para “para desfazer-se das barragens, se forem devolvidos os 2115
milhões de euros pagos, bem como para "fazer as contas" e reverter os
CMEC”. E, para provar que a EDP até perdeu 200 milhões de euros com a tal troca
dos CAE para os CMEC, António Mexia levava um estudo completamente independente
e idóneo, encomendado à Nova School of Business and Economics, essa cujo campus
foi patrocinado
pela…EDP.
Ricardo
Salgado, que consegue dormir apesar de não totalmente
descansado, é outro mártir incompreendido da pátria.
Não lhe cabe nenhuma culpa, nem no colapso do seu banco, nem na delapidação das
poupanças de muitas vidas (alguns terão procurado lucros demasiado fáceis, é
verdade). Era só mais uma injecçãozita de capital e resolvia-se o problema,
mas, o que havia era uma enorme vontade de acabar com o Banco Espírito Santo,
toda a gente sabe que somos um país de invejosos. Ou isso, ou o Diabo, mais as
suas coincidências.
Bom,
o caso que é Ricardo Salgado foi afastado
da liderança do BES e de outros cargos em instituições financeiras nos próximos
anos. Mas, ao ritmo a que se move a Justiça
portuguesa, o banqueiro ainda é bem capaz de regressar em emocionada e ansiada
apoteose, que é como quem diz, ainda volta a ser dono disto tudo, que há manias
que nunca se perdem.
E,
a provar como é fantástico fazer negócios com o Estado português – não para
todos, é verdade – lá chegamos, então, à nova factura desse Novo Banco. Em princípio, não será a última, já nos
descansaram quanto a isso. Afinal, ainda restam,
parece, dois mil milhões lá no fundo desse Fundo de Resolução, que dificilmente
resistirão até 2025, como se (calhar ninguém, seriamente) previa. Pelo sim,
pelo não, o Governo, diligente, pediu uma auditoria. Deve ser parecida com a da
Caixa Geral de Depósitos, mais grande devedor, menos grande devedor. Que nunca
devem nada, aliás: investem dinheiro que não é seu, se correr bem, ficam com os
lucros, se correr mal, o Estado paga. Quem disse que para ser empresário é
necessário correr riscos?
Manuel Pinho
inaugurou a tendência e continuam todos a fazer-nos corninhos. Seja na forma de
comissões de inquérito, entrevistas ou auditorias...