sábado, 16 de maio de 2020

É o bicho. Foi(-se) o bicho.




Desses que mexem, agora, com a nossa (a)normalidade. O do agoirento vírus do nosso confinamento e o do Bruno Nogueira, na forma de um programa de que só tive conhecimento a título póstumo. Inacreditável. Às vezes, parece que vivo uma (e numa) realidade paralela.

Bruno Nogueira não faz parte do meu imaginário humorístico. Aparentemente, nem sequer da minha realidade do género, desse ou de outro. Ouço-o, ocasionalmente, no carro, quando sintonizo a TSF, brandindo o seu Tubo de Ensaio, que também já teve data de termo, mas lá vai sobrevivendo e bem. Rio, aprecio a inteligência, o trocadilho infame, por vezes, e a coisa fica por ali. Não sou particularmente sensível ao humor feito de vernáculo; porque não, simplesmente, sem melindres, falsos pudores, muito menos, apopléticos assomos de escândalo. Mas tal não justifica que nem tivesse, sequer, ouvido falar do programa. Ou lido. E não faltam, percebi depois, notícias sobre o bicho, inclusive, em jornais que consulto a diário. Enfim, o confinamento terá também razões que a própria razão desconhece e, possivelmente, nem aprova. E eu não tenho Instagram
O facto é que desconhecia por completo que, durante cerca de dois meses, todos os dias, a partir das 11 da noite, Bruno Nogueira dava início a um live – parece que é assim que se diz por lá. Também me dizem que perdi horas e horas de saudável e merecido entretenimento, material em bruto de um "caso de estudo", gargalhadas redentoras, apaziguadoras e tudo o mais que, inadvertidamente, deixei que me escapasse. Ainda não me dei ao trabalho de avaliar a real dimensão da tragédia, mas, comecei a penitenciar-me assim que esbarrei com Alexandre Farto, o Vhils, a braços com a sua desassombrada homenagem a Zeca Afonso gravada à força do punho e da mente do artista numa parede da sua própria casa, a união perfeita entre o talento e a fúria dos romances que preenchem, de tempos a tempos, a nossa ausência mundana. Afortunadamente.

Nesse mesmo dia, perdi outro momento generoso: aquele em que Eunice Muñoz decidiu participar na construção da memória que há-de unir, por anos vindouros e mais amenos, espero, os milhares de fãs desse caprichoso bicho que, não só ainda mexe, como promete deixar sequelas. Afinal, como o seu gémeo mau. Mais ou menos, que, desse, poucos sentirão a falta.