quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Textos inacabados


Sobre o assassínio de Ihor Homeniuk, às mãos – e, aparentemente, aos pés e bastonadas – de três inspectores do SEF sem tempo nem necessidade de ir ao ginásio. Bruno Sousa, Duarte Laja e Luís Silva, munidos daquela raiva animalesca que transforma homens em bestas porque sim, e porque não também, descarregaram todas as suas frustrações num homem manietado. Bater em gente que não tem como se defender, de preferência estando acompanhado pelos restantes elementos da matilha, eis como costumam gozar os mais cobardes entre os cobardes. 

Dizem as autoridades que Ihor reagiu mal às tentativas de o fazer entrar no avião que o levaria de regresso ao seu país e, como é sabido, há quem não goste de ser contrariado. Ihor Homeniuk foi brutalmente agredido: várias costelas partidas, hematomas na caixa torácica, no abdómen uma marca compatível com a sola de uma bota da tropa, preso durante horas com as calças pelo joelhos e cheiro a urina. A morte de Ihor começou por ser declarada “natural” e o mais que se lê no relato da investigação é de uma violência atroz. Como é que foi possível? Não chega haver demissões. É tudo demasiado escabroso.

Sobre o senhor professor doutor Francisco Aguilar e o seu repúdio pela "miopia moral da fêmea", de todas as fêmeas, principalmente, daquelas que ainda não superaram a "inveja do pénis" e, como tal, têm um "ódio genético" ao "privilegiado genético, isto é, o biologicamente privilegiado por Deus", isto é, o homem. Não sei que fêmeas e machos é que o senhor professor doutor conhece, mas, tudo isto teria imensa graça, não quisesse o senhor professor doutor ensinar coisas parecidas com aquelas às fêmeas e aos machos com quem tropeça lá nas aulas de Direito Penal, ou lá o que é. Quanto a inveja de pénis, o que me parece é que há machos que talvez não tenham sido assim tão biologicamente privilegiados por Deus e precisam de se entreter com qualquer outra coisa. Por exemplo, a escrever artigos para revistas científicas de "circulação estrita" (logo por azar, a circulação alargou-se) e elevada exigência, mesmo que a opinião expressa nesses artigos não seja para levar a sério

O escandaloso drama de tudo isto é o facto de Francisco Aguilar ser, de facto, professor na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa há décadas, ser responsável por "ensinar" e "avaliar" futuros profissionais na área e poder continuar a espalhar a sua "liberdade científica" se o caso não tivesse vindo parar à comunicação social. Os "arrependidos" de lhe terem dado cobertura só se arrependeram porque a coisa veio a público. Enquanto a liberdade do dito cujo se passeava apenas pelos corredores e pelos anfiteatros da Faculdade, estava tudo muitíssimo bem e, provavelmente, recomendava-se.


Sobre o professor francês, tatuadíssimo, que se viu impedido de ensinar crianças num jardim-de-infância, depois de os pais de um menino de 3 anos se queixarem de que o filho passara a ter pesadelos, impressionado com o aspecto de Sylvain Helaine. Nem sei bem o que pensar. Gosto de algumas tatuagens e gosto de ver gente tatuada. Alguma gente. As tatuagens são como os chapéus: podem ser magníficos e, no entanto, um absoluto desastre em algumas cabeças; o que não deve impedir ninguém de os usar, obviamente. O mesmo se aplica às tatuagens. Só ainda não me atrevi, porque tenho uma irracional e quase histérica aversão a agulhas. Quando preciso de fazer análises de sangue, só não choro porque já não tenho idade. Mas, como se diz, uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. O professor há-de ser competentíssimo e simpatiquíssimo e todos os outros superlativos adequados e fofos de que nos possamos lembrar, e ninguém poderá dizer que não entende o susto do menino de 3 anos.


Sobre a miúda que quase atropelei, há pouco mais de uma semana. Uns 15 ou 16 anos. Não calhou. Valeram-nos os anjos da guarda, o meu e o dela, eventualmente os meus 30 anos de experiência de condução, cá dentro e lá fora, o facto de não haver ninguém atrás de mim nem ao meu lado, nem dentro do carro, nem fora do carro e aquilo a que, alguns, chamarão destino. Não era o dia. E, tudo isto porquê? Porque o semáforo estava aberto para mim e a miúda, de headphones bem colocados e sem deixar de olhar para o telemóvel, resolveu sair do passeio, bruscamente, e atravessar-me na minha frente. Ainda não sei como o carro parou onde parou, a menos de nada da coxa dela. Depois do susto de ambas, do alívio de ambas, apeteceu-me dar-lhe um puxão de orelhas, obrigá-la a entrar no carro e levá-la, em segurança, lá para onde quer que fosse que ela fosse. E tudo isto a propósito do limite entre a irreverência e a palermice pura. É que já me parece palermice pura aquela defesa da liberdade dos que querem viver a covid como lhes apetece. Eu também acho que cada um deve viver como lhe apetece. Morrer como nos apetece; sobretudo, morrer como nos apetece, já que, viver, não nos perguntaram se queríamos. Simplesmente, tenham algum dó de quem estiver ao volante, nesse momento de libertação.


E o nosso Berardo. Outro magnífico exemplar que a pátria pariu com a ajuda de uns quantos, quase sempre os mesmos, que nada tem de seu, muito menos dívidas. Parece que está a construir uma obra sem ter licença de construção para essa mesma obra. Deve ser mais ou menos o mesmo método que usou para ampliar a casa-de-banho com vista para o Palácio das Necessidades (parece piada, não é?), que o tribunal já ordenou que fosse demolida, por ser ilegal, mas que continua de pé.


E mais coisas, mas, de momento, não tenho mais tempo. Até escrevi aqui, directamente, em não em word, primeiro, como é meu hábito.