Estou obcecada com o processo em curso para as eleições presidenciais americanas. Entre o estupor e uma espécie de fascínio macabro. Posso perguntar-me quinhentas mil vezes ou mais e nunca hei-de perceber como alguém com a dose mínima de decência consegue apoiar alguém como Donald Trump. Para o cargo mais alto da nação, quero dizer. Como personagem de entretenimento, é uma figura imbatível.
Na semana que
terminou, apoiantes seus, de carro, perseguiram a caravana de campanha de Biden que se dirigia para um qualquer evento no Texas. Um dos veículos conduzido por um dos
fanáticos adeptos de Trump abalroou, intencionalmente, um veículo conduzido por
um dos apoiantes de Biden. Claro, ninguém está livre de ter um apoiante maluco.
Mas, o caso não é esse. Com Trump, o caso nunca é só esse. Apressou-se, como
sempre, a tuitar que adora o Texas, como já disse – no típico tom pateta e
indecente fora dos moldes de um reality-show (aqui, já toda a gente sabe
ao que vai), que espera por terça-feira para despedir Anthony Fauci. Como já
antes tinha gozado com a deficiência de um jornalista, perante uma assembleia
de idiotas que baba (no mínimo, que é o se pode ver) cada vez que o idiota-mor
vomita qualquer insulto. Começo a ter mais “respeito” (com muitas, muitas
aspas) pelos supremacistas brancos assumidíssimos, do que por aquela gente que
se enche de sedas e folhos e botões de punho para dizer que Biden é que jamais
– assim, em francês, com a elegância que se espera. E eu até gosto de francês.
E até acho que há gente que merece ser gozada. À bruta.
Por falar em eleições, parece que os Açores vão ensaiar uma geringonça insular. Passada a quase apoplexia (se ainda não passou – e há gente para quem ainda não passou – passará agora) do PSD com a marosca política de António Costa, é tempo de tentar o mesmo. Como é sabido, todas as indecências políticas por que se rasgam vestes na oposição, passam a aceitáveis, e respeitáveis, quando fazem antever a conquista do tal Poder, seja lá o que isso for. O Poder. Até o CHEGA pode passar a, sim, sim, já chega para haver o entendimento que sempre repudiámos. O sistema é um nojo apenas enquanto não se lhe deita a mão e, na verdade, nesse aspecto, não parece haver grande diferença daquele partido para os outros.
E prepara-se outro
confinamento. Pergunto-me quanto tempo mais (nos) vamos aguentar. O meu filho
pergunta se eu acho que isto acaba alguma vez, como se eu
soubesse alguma coisa sobre o assunto; mas, juro-lhe que sim, que vai acabar,
claro que vai acabar, e abraço-o e encho-o de beijos enquanto posso (posso, não
posso?), enquanto ele ainda me deixa. Há uma idade menos desgraçada para passar
por isto, afinal. São estes 13 anos, em que já não se está a dar os primeiros
passos neste mundo às avessas, mas também ainda não se chegou bem àquela
maravilhosa loucura da adolescência. Como será? Viver a adolescência nestes tempos,
sem poder cometer pecados, sem viver arrebatadamente, a primeira paixão, o
primeiro beijo, a primeira mentira a merecer castigo?
Pela Europa,
multiplicam-se as manifestações contra as restrições impostas pelos diferentes
governos. Porém, há manifestações e manifestações. Há vontades e vontades. Não
consigo perceber as lutas pela liberdade de fazer o que me apetece
quando me apetece e onde me apetece que, mais coisa menos coisa, acabam em
destruição porque sim. Manifestações violentas de gente que acredita em teorias
da conspiração mirabolantes. Outra coisa são as manifestações pela liberdade de
se viver do trabalho e não de subsídios, ou de caridade. Este equilíbrio –
entre a economia e a saúde, no limite indecente da salvaguarda de ambas – é
terrível de fazer. Não queria estar no lugar de nenhum daqueles que têm esta
tarefa entre mãos, neste momento. Não sei se já não teria atirado a toalha e
dado lugar a outro, com a quantidade de gente que sabe qual é a melhor
estratégia a aplicar para tourear o bicho. Há quem julgue que se mantêm lugares exclusivamente pela ganância, pelo interesse próprio, pelo poder (ia dizer pelo prestígio, mas, creio que, em política, isso já não existe). Eu também. Excepto, talvez, em
casos destes. Alguém consegue passar por tudo isto sem uma pontinha que seja de
sentido de Estado e de serviço público? Se calhar há e eu estou só a ser demasiado ingénua, ou coisa pior.