Ninguém sabe muito bem o que fazer com o líder do Chega, como ninguém soube muito bem o que fazer com a ascensão apoteótica de popularidade de Donald Trump.
André Ventura é um
populista vaidoso que dança conforme a música e que defende os “princípios” que
lhe forem mais úteis em cada momento. Mas também já se percebeu que isso
interessa pouco e de pouco adianta tentar desvalorizar ou tentar humilhar estes
santos de pau oco. Essa é uma estratégia que contribui, apenas, para empolgar o
fenómeno. O tipo de discurso de André Ventura vende como castanhas quentes
porque há sempre, na vida de cada um de nós, um momento em que sentimos algumas
destas coisas como verdade. Justa ou injustamente, por muito breve que seja
esse momento e por muitos remorsos que possamos sentir a seguir. O facto
de cada adversário ter o seu próprio telhado de vidro, uma janelinha pequena
que seja, serve primorosamente os propósitos do espectáculo que estes
verdadeiros artistas sabem montar como ninguém. O discurso aos gritos, o dedo
em riste, enxotar as acusações com outro golpe de teatro, sem esmorecer nunca
no contra-ataque são balas certeiras e desfazem o alvo com a eficácia
pretendida, minuciosamente calculada. O insulto fácil e sem sobressaltos de
consciência desfaz o que quer que tenha sobrado. Infalível.
A direita não
voltará ao poder tão cedo sem o apoio do Chega – como não se cansa de nos
explicar, (im)pacientemente, o João Miguel Tavares – e, como é sabido, o que
verdadeiramente importa é chegar ao poder. O que fazer, depois, com esse poder
é todo um outro tratado.
O homem que, em
Portugal, não quer ser o presidente de todos os portugueses tornou-se
omnipresente em todas as discussões políticas. A gritos, mas não só. A comunicação social não
gosta que se lhe aponte responsabilidades na promoção do fenómeno trump à
portuguesa, mas há responsabilidades sim. Se não noutra coisa, na enorme falta
de jeito para lidar com o assunto. Até agora, nos “debates presidenciais”.
Não entendo o
discurso do “não me interessa a forma”, para apoiar André Ventura. Como para
apoiar Trump nos EUA e Bolsonaro no Brasil. Quem ouviu André Ventura defender a
sua direita sabe muito bem ao que vai, quando decidir entregar-lhe o
voto. Não venham esses, depois, encher-se de espanto e de nojo com as consequências, como
fizeram alguns dos nossos mais fervorosos simpatizantes das políticas do ainda
presidente dos EUA. Estava tudo a correr tão bem, não era, até à chegada do
homem dos corninhos de viking, ou lá o que era. Começo a ter mais apreço (não é
apreço, mas falta-me qualquer coisa melhor) pelos trogloditas assumidos do que
por aqueles que se distraem em contorcionismos para se fingirem castos.
Ainda a propósito da
melhor forma de combater estes protótipos de fascistas, que não se podem chamar
fascistas, tenho muitos dúvidas sobre a melhor estratégia de lhes tirar palco, mesmo sabendo que é urgente impor um limite entre a liberdade de expressão e a liberdade de difundir as mentiras mais obscenas. Mas, agora, não tenho mais tempo.
E vamos reconfinar. Abstenho-me
de grandes considerações sobre o assunto, porque, com excepção das teorias da minha
liberdade acima de tudo e a qualquer custo, e, havendo custo, de preferência,
que o paguem outros, sou capaz de aceitar argumentos pró e contra. Estou assim
de perdida, neste tema…