Há muitos anos que desisti de leccionar para me sustentar. Por motivos vários, mas, o principal, pela completa incapacidade de resistir, ano após ano, durante vinte ou mais anos, de casa às costas, ou, pior, de quarto alugado em quarto alugado, como muitos, filhos menores pela mão, com a perspectiva de “entrar em quadro de escola” lá pela idade da reforma: arrepio-me só de imaginar. Mas não a minha irmã, professora de Filosofia – de filosofia, senhores, eu, pelo menos, sou das ciências exactas, sei que não há humor nas moléculas, isso é outra história, mas sempre podia fazer explodir um pedaço de sódio, implodir uma lata de coca-cola sem lhe tocar, equilibrar dois garfos na ponta de um fósforo queimado, explorar o espanto, mas filosofia?!, é preciso ser uma professora altamente competente e irremediavelmente apaixonada pelo ensino público, e também não sou dessa massa, ao contrário da minha irmã. Não interessa nada. O que me interessa, de momento, é a mensagem e as fotografias que me enviaram, de autocarros parados pela GNR em acções de fiscalização, com direito a coimas por transporte ilegal de comida e bebida nas mochilas de mão, e por comida e bebida entenda-se garrafas de água e umas sandes para o caminho, não propriamente um barbecue regado a champagne. Não é piada, há mesmo uma ilegalidade, embora, dizia um dos motoristas, nunca se viu.
Não tenho uma opinião fundamentada sobre estas greves; nunca fiz greve. A minha irmã, com mais de quinze anos de ensino, nunca tinha feito greve até aqui e eu confio nela, apesar de nem sempre estarmos de acordo. Sei, de saber próprio, que há muitas críticas que se podem apontar aos professores, como a qualquer outra classe profissional, mas acho isto vergonhoso, tal como as declarações do ministro João Costa, ontem.