A
resignação com que aceitamos não sei se a incompetência, a leviandade, o abuso,
a agenda, ou tudo isso em um, do Ministério Público é coisa que não pára de me
espantar.
Quando
José Sócrates foi detido no aeroporto de Lisboa pensei, como outros ingénuos,
que seria impossível uma acção daquelas sem uma acusação sólida, assente em
provas fumegantes: não poderia ser de outra maneira,
arriscar um passo daqueles, mesmo sabendo quão difícil é provar alguns crimes,
como os de corrupção. Passaram quase dez anos e o mais provável é Sócrates não
chegar, sequer, a ser julgado. À parte todos os expedientes jurídicos com a
intenção única de adiar, adiar, adiar, junta-se a bizarra inépcia da acusação, facilmente
desmembrada por advogados competentes, capazes de arrancar a pele à Lei. Há
crimes em risco de prescrever, claro, e com jeitinho, o Estado – ao que parece, somos nós – ainda virá a ser alvo de um pedido de indemnização capaz de
liquidar todos os empréstimos generosos do amigo Santos Silva.
Claro
que as acusações não podem ser tomadas por factos e a justiça faz-se nos
tribunais; mesmo no caso de José Sócrates, em que só os mais ingénuos entre os
mais ingénuos acreditam no era uma vez um amigo tão rico tão rico, que gostava
tanto mas tanto de mim, que, apenas por amizade e generosidade, não só financiava
todas as minhas despesas correntes e incorrentes, como me permitia uso e abuso
de apartamentos em Paris com usufruto até dos humores sobre a decoração. Veremos.
Agora,
a Operação Influencer, que fez cair um Governo, parece condenada a idêntico
fracasso. As escutas a que João Galamba esteve sujeito durante quatro (q-u-a-t-r-o)
anos, por exemplo, serviram para três juízes do Tribunal da Relação de Lisboa concluírem
que o ex-ministro das Infraestruturas pudesse estar, apenas, preocupado com o “Interesse
Nacional” (ainda lhe ficaremos a dever uma estátua). Há erros, especulação e
ruído; o que não há é indícios de favorecimento indevido do tal megaprojecto
Sines 4.0, como não há elementos que possam pesar contra António Costa, malgrado o último
parágrafo, colado com cuspo no famoso comunicado da PGR. E a tudo isto, o Presidente
da República reage com comentários quase jocosos, porque o país é a sua sala-de-estar
e a pátria tolera-lhe todas as indisposições.
Quanto
à Procuradora-Geral da República, move-se hirta e muda pelos corredores da
tragédia, com o enfado dos soberbos, como
se não tivesse a obrigação urgente de nos prestar contas.