Perdi a cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Paris. Quando voltei à superfície, reinava a discórdia em torno da Última Ceia, que afinal era a Festa de Dionísio, que afinal era uma afronta ao cristianismo, que afinal era uma celebração da diversidade.
Já não vou a tempo de decidir
imparcialmente, há um coro histérico de dizeres, entre ofensores e ofendidos, que
impede um olhar isento. Há pedidos de desculpa e há ameaças de morte. É insano.
Por outro lado, espanta-me o espanto das direcções artísticas que se metem
nisto: não podem ser nem tão ignorantes nem tão ingénuos, pelo que nunca
percebo os piedosos pedidos de desculpa depois do mais que previsível desastre.
Está aqui, é isto, é um trabalho artístico, ofensivo ou não, pensámos assim,
criámos assim. Ponto.
Fui
espreitar, claro. Não achei ofensivo, mas também não achei belo. Não gostei. Pode ser apenas por preconceito, não sei. É verdade que não
amadureci ainda (e, francamente, duvido que lá chegue) alguns conceitos de igualdade e inclusividade
que me livrem, por exemplo, da estranheza de ouvir dizer “pessoas que menstruam”, ou a
gravidez é “culturalmente entendida como exclusivamente feminina” – ninguém
sara por decreto, e esta imposição bruta e à bruta de uma suposta linguagem
neutra corre o risco de resvalar para o embuste, se divide e não une, furiosa e soberba. Não há decreto que obrigue o pensamento.
Fico-me por Lady Gaga e Céline Dion. Gosto mais da primeira, é um facto, mas: Céline Dion canta uma das músicas mais enjoativamente românticas que ainda gosto de ouvir; acho formidável vê-la ali brilhante e maravilhosa apesar da sua doença terrível; e Edith Piaf é eterna.