sábado, 31 de agosto de 2024

Estrada DN7C na Roménia, a famosa Transfăgărășan

 



Normalmente, é a mim que me toca a preparação dos itinerários. Levo sempre um roteiro detalhado, que, obviamente, raramente consigo cumprir na íntegra: mais olhos que barriga, também posso dizê-lo das viagens que faço. Entre o que me contam e o que eu descubro, o que programo e o que me surpreende, a vontade de beber de tudo e o tempo que se precipita totalmente alheio aos meus humores. Mas não queria falhar a tal DN7C, a famosa Transfăgărășan. Noventa e qualquer coisa quilómetros de pura beleza, através das Montanhas Făgăraș, nos Cárpatos Meridionais. Bela até no nome, trans făgărășan, através das făgărăș, sinuoso como o caminho que leva ao topo, ao lago Bâlea, a mais de dois mil metros de altitude. Curvas fechadas, infinitas, quedas abruptas, túneis, a paisagem que se revela e se esconde, que muda dramaticamente a cada volta, um ponto vermelho aparentemente suspenso no ar, que demora a perceber-se ser uma cabine de teleférico.

Um caminho para fazer sem pressa, por todos os motivos, embora a condução não seja tão difícil quanto possa parecer à primeira vista. 




Há os encontros ocasionais (foram mais de vinte, sem contar as crias, não sei se ocasional se aplicará muito bem) com os ursos, entre os impacientes que buzinam e ultrapassam com risco, e os facilitadores que não se limitam a dar comida aos bichos, mas saem dos carros e quase montam tripés para a fotografia perfeita. Havia uma miúda de dez ou doze anos, fora do carro, a poucos metros de um colosso daqueles, com uma máquina fotográfica pousada no chão, ensaiando o melhor enquadramento, ao lado da mãe (digo eu), fotógrafa do mesmo calibre. E eu não queria nem que o meu filho abrisse o vidro do carro...

Estas não são perfeitas, mas são impressionantes – pelo acaso, pela proximidade –; não são minhas, porque conduzia, mas são da minha gente. 








Provavelmente, não pararia se pudesse passar, mas não era o caso. Às vezes, não há como sair da linha. 
Desde aqui, com aquele ar quase dócil, parece impossível pensar que podem matar. São animais impressionantes. A mim, bastava-me o susto dos ocupantes do automóvel três lugares à frente do meu, quando um dos ursos se pôs de pé e se debruçou sobre o carro, com as patas nas barras do tejadilho. A dada altura, aquela lenta fila indiana pode tornar-se numa verdadeira armadilhada. 




quinta-feira, 29 de agosto de 2024

"Wildlife photographer of the year 2024 – preview"

 



"Pantanal, Brazil. 

Photograph: Ian Ford/Wildlife Photographer of the Year/PA"


"Biserica evanghelică fortificată Hărman"

São muitos os que a ignoram a favor de Prejmer (espantosa, também), mas a igreja fortificada de Harman guarda uma pequena preciosidade: um rico e admirável conjunto de pinturas medievais que decoram o interior da Turnul CapeleiChapel Tower, como descrito nos guias em inglês.

Os frescos de Harman são notáveis. Dizem-nos os mais antigos e mais bem conservados da Roménia, e é espantoso como se mantêm: parecem quase abandonados, naquele espaço diminuto e sereno, de paredes robustas e antigas. De uma impressionante riqueza artística, detalhados, expressivos, exímios contadores de História e histórias. A vantagem de visitar lugares que ninguém vê é o tempo que nos sobra para ouvir. 













Saramago na Roménia

 


Não me lembro de alguma vez ter visitado uma livraria fora de Portugal que não tivesse Saramago nas estantes; e são muitas vezes, em muitos lugares diferentes.






quarta-feira, 28 de agosto de 2024

 


“When I watched the horizon, I saw the abrupt, contrasting transition from the earth’s light-colored surface to the absolutely black sky.
I enjoyed the rich color spectrum of the earth. It is surrounded by a light blue aureole that gradually darkens, becoming turquoise, dark blue, violet, and finally coal black.”

 Yuri Gagarin


Não é bem; mas, por um instante, pareceu-me. É uma das minhas mais belas fotografias deste Agosto, esse mês que tolero porque me leva a ver o mundo, e céus glaciares, de nuvens espelhadas. 



domingo, 4 de agosto de 2024




 

sexta-feira, 2 de agosto de 2024


De pé, em frente ao túmulo, deixava os olhos repousarem, pela enésima vez, no rosto jovem e alegre, imortalizado na lápide de mármore branco. A carícia – fria como a pedra dura, porque não era homem de emoções – repetida ao longo de quase cinco décadas como um ritual sagrado, permanecia como uma penitência, redimindo-o, em parte, da perda que o amputara para sempre. Aos setenta e dois anos, era um homem amarguradamente só a quem a vida jamais havia sorrido, com excepção daquele fugaz amor de juventude, quando ainda mantinha a ingenuidade de pensar que o seu destino lhe pertencia. Idiota. O destino, para homens como ele, não admitia desvios nem devaneios. Fora escrito e forjado com a mesma dureza e disciplina que o epitáfio diante de si.  



Paris, Paris

Outra vez?

É cansativo, eu sei, mas apetece-me voltar. 

 


Em Agosto (também já houve Julho, sim), sofro de uma espécie de síndrome de Drácula. Levanto-me ao pôr-do-Sol e deito-me ao nascer do dia, que é como quem diz, sobrevivo mal ao calor tórrido de Verão, à minha crónica tensão baixa, às areias de praia ferventes mais as histriónicas colunas de som portáteis e berrarias afins, a homens de chinelos no dedo pelas pedras da mortífera calçada portuguesa (em qualquer lugar, para ser sincera), e a minha tolerância a corpos suados é caprichosa: tem modos e luares. 

Em vez de me enterrar num caixão de terra profana e negra até que Setembro acabe e me devolva o frescor dourado de Outono, decidi-me a assistir às quatro horas da cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Paris. Com algum atraso e alguma batota, já que fui avançando nas partes menos interessantes – não sei se foi por aí que perdi a lua cheia dentro de um dos anéis olímpicos como numa moldura, no colo da Torre Eiffel: dizem que aconteceu, e eu acredito.

Adiante.

Foi grande e francesa, a festa. Criativa, arrojada. Exuberante.

Fiquei ainda mais perplexa com o “quadro” da polémica, naquele contexto.  Só nas imagens paradas – e não em todas – que enxameiam as redes pode surgir uma pequena analogia com essa Última Ceia, e talvez apenas por sugestão. Continuo a não encontrar grande beleza naquele trecho em particular, mas houve bastante mais naquela coreografia de Barbara Butch: é absurdo o rumo que aquilo tomou, com ameaças de morte, perda de patrocínios e o cantor francês que evocava o deus grego Dionísio a pedir perdão não sei bem porquê.

Parece que houve outro escândalo com a actuação de Aya Nakamura, que (também) cantou Charles Aznavour, acompanhada pela banda da Guarda Republicana Francesa: também vi e foi lindo. Formidáveis, os franceses Gojira, nas janelas da Conciergerie, onde assomavam representações de Maria Antonieta decapitada.

A chama olímpica suspensa num balão de ar quente, a cavaleira misteriosa sobre as águas do Sena, transportando a bandeira olímpica (que, depois, foi içada ao contrário, parece-me, mas quem nunca, não é?).

A homenagem às mulheres que marcaram a história de França. E a Marselhesa, no topo do Grand Palais e na voz de Axelle Saint-Cirel. Magnífico.


quinta-feira, 1 de agosto de 2024