sexta-feira, 18 de outubro de 2024

Marginal

Sei que posso ser muito ingénua, mas há sempre pior. Por exemplo: os que acreditavam piamente que Pedro Nuno Santos ia “analisar”, “ponderar” e decidir “responsavelmente” viabilizar ou não viabilizar a proposta de Orçamento de Estado do Governo de Luís Montenegro, há uma semana, quando era evidente desde a noite em que assumiu estoicamente a derrota que o líder do PS não confiava nada naquele “não é não”. Creio que a pressa vinha daí: uma vitória curtíssima da AD mais uma subida estrondosa do Chega igual a aqueles tipos vão ter mesmo de se entender, e eu posso lavar as mãos como Pilatos.

Luís Montenegro não será o estratega brilhante que levou a sua vontade a bom porto contando com a impetuosidade suicida do enfant cada vez menos terrible: soube esperar, arriscou, e, a dada altura, os astros alinharam-se. No dia em que anunciou ao país as alterações ao Orçamento de Estado para ir ao encontro das exigências do PS, ainda deglutia um pequeno sapo; muito longe do sorriso quase escarninho de ontem. Esperou, desejou, conseguiu, diria o senhor presidente. Esteve muito bem.

Podíamos, agora, parar por aqui no quem é que humilha quem, mas o povo gosta de sangue e a comunicação social faz as exéquias com indisfarçável gula. Nem falo das outras “forças políticas”, porque não há nenhuma realmente interessada em discutir soluções; AD incluída. É uma guerrinha de bastidores, ataques pessoais, mediocridade ao mais alto nível.

Ontem assinalou-se o Dia Internacional da Erradicação da Pobreza. Portugal tem mais de dois milhões de pobres. Mesmo entre os que trabalham a tempo inteiro, há quem trabalhe apenas para pagar contas. Será assim tão difícil encontrar pontos comuns para acomodar uma discussão séria sobre isto? Pergunta a parte ingénua de mim.