Falta-me
talento para odiar. Se o tivesse, o que não faria das mulheres que moram nos
teus sonhos; mesmo daquelas a quem dás o meu nome.
sábado, 30 de novembro de 2024
sexta-feira, 22 de novembro de 2024
quinta-feira, 21 de novembro de 2024
O filho de uma grande amiga – a amiga que me liga para
nos ouvirmos rir, aquela com quem tenho uma relação quase telepática – está,
neste momento, na Suécia a fazer parte do mestrado. Recebi a mensagem na
segunda-feira ao fim da tarde: uma fotografia do pequeno caderno de instruções
sobre o que fazer em caso de guerra. Num primeiro e brevíssimo instante pensei
que era uma piada.
Pragmáticos, os suecos.
Março de 2020; o vírus que vinha da China – ou talvez
não, tinha escapado de um laboratório em Wuhan, não, não era possível,
mostravam os estudos genéticos, talvez sim, afinal os estudos não são
conclusivos, enquanto as vacinas são seguríssimas, ou se calhar não. Era a
maior ameaça ao mundo que me cabia. Imperava um medo fraterno. A bondade não
emergiria das cinzas para suturar a ponto arco-íris as chagas da humanidade,
mas havia um embrião de esperança. Estávamos em guerra, quando a guerra
podia ser invocada em vão, impunemente, poeticamente, sem agravo nem remorso.
Foi ontem, e foi como se se tivesse passado um século. O novo normal deu
lugar ao mundo mudou. Uma mutação orgânica, febril, corrosiva, um corpo
vivo que se contorce e regenera perpetuando a sua própria fragilidade.
Ando obcecada, furiosa, perplexa, fascinada. A zona de
interesse ruiu; resta este entre-lugar, movediço, imparável, de onde só se
regressará a ferros, rasgando ventres e carregando as dores. Só a noite me
parece inviolada; é nela que te guardo e reconheço.
sábado, 16 de novembro de 2024
sexta-feira, 15 de novembro de 2024
terça-feira, 12 de novembro de 2024
segunda-feira, 11 de novembro de 2024
À tarde, ouvi as preces dos pássaros. Há um sussurro de vozes carregadas pela brisa a que ofereço o rosto para que me mime. E a ladainha rouca do vento que me sopra ao ouvido segredos por revelar. Uma provocação dos meus sentidos. O mesmo vento imprevisto que faz gemer a rocha lascada num coro de penas. Uma expiação onde nem sempre te encontro.
A morte de dez pessoas a quem falhou, pelo menos, um primeiro socorro como consequência directa das greves no INEM é quase uma notícia de rodapé. O que agora tem ocupado horas e horas de emissão informativa é a transferência de Rúben Amorim para o Manchester United. Sabemos escolher “causas nacionais”. Os canais ditos de informação transformaram-se numa espécie de passadeira vermelha, um desfile de vaidades de gente maioritariamente presunçosa e medíocre. Tal qual este Governo parido por Luís Montenegro. Demissões porquê, para quê?
Sobre a desfaçatez do Presidente da República já tudo se disse. Marcelo Rebelo de Sousa é um impostor já muito pouco suportável: não gosta “de falar de problemas específicos da governação ou da Administração Pública, mesmo quando são muito urgentes ou muito prementes”, a não ser quando gostava e falava e exigia e ameaçava, vá lá, não lhe estraguem o final de mandato, a ver se o senhor recupera isso da popularidade.
sábado, 9 de novembro de 2024
quinta-feira, 7 de novembro de 2024
quarta-feira, 6 de novembro de 2024
Se eu gritar quem poderá ouvir-me, nas hierarquias dos Anjos? E, se até algum Anjo, de súbito, me levasse para junto do seu coração, eu sucumbiria perante a sua natureza mais potente. Pois o Belo apenas é o início do Terrível, que só a custo podemos suportar, e se tanto o admiramos é porque ele, impassível, desdenha destruir-nos. Todo o Anjo é terrível. |
Sim, as primaveras precisavam de ti. |
Mas às amantes, retoma-as a natureza no seio esgotado, como se as forças lhe faltassem para realizar duas vezes a mesma obra. Assim a flecha ultrapassa a corda, para ser no voo mais do que ela mesma. Pois em parte alguma se detém. |
Vozes, vozes. Ouve, meu coração, como outrora apenas os santos ouviam, quando o imenso clamor os erguia do chão; eles porém permaneciam ajoelhados, tão absortos ouviam. Não que possas suportar a voz de Deus, longe disso. Mas ouve essa aragem, a incessante mensagem que o silêncio prodiga. Ergue-se agora, para que ouças, o rumor |
É estranho, sem dúvida, não habitar mais a terra, Através das duas esferas, todas as idades a corrente eterna arrasta. E a ambas domina com o seu rumor. |
Os mortos precoces não precisam de nós, eles que se desabituam do terrestre, docemente, |
Rainer Maria Rilker – Primeira Elegia
terça-feira, 5 de novembro de 2024
segunda-feira, 4 de novembro de 2024
Degradação
Ontem ouvi Jaime Nogueira Pinto – um dos nossos apoiantes trumpistas – criticar Kamala Harris por não ter nada para dizer, excepto “dizer mal” de Trump. Só não dá para rir porque a coisa é realmente séria. Também não vale a pena arrancar cabelos: é o que é. Mulheres insultadas por Trump apoiam Trum; imigrantes insultados por Trump apoiam Trump. Não é estupidez, é economia, dizem os entendidos. Pode ser, em parte. Mas é, essencialmente, poder. Poder na sua forma mais primitiva. Os "homens fortes" querem continuar a sê-lo, e em crescendo. Como nem todos são completamente idiotas, Elon Musk há-de enxotá-lo como a uma varejeira assim que puder dispensá-lo – Trump pode ser "um tipo fantástico", mas não passa de um peão no xadrez do homem mais rico do mundo.
Já não estamos em 2016. Quem vota em Donald Trump – quem votaria em Donald Trump se pudesse – já não o faz “apesar de”, “apesar dele”. Aceitam ser representados por um homem que elevou o insulto taberneiro, a perseguição, a vingança, a programa político. Normalmente, são os mesmos que rejeitam a “venezuelização” da pátria, o comunismo, a doutrinação das massas, os rebanhos e etc – Trump, evidentemente, é o oposto disso tudo: são sempre superiormente inteligentes os que pensam como nós.
domingo, 3 de novembro de 2024
«En España, lo mejor es el pueblo. (…) Siempre ha sido lo mismo. En los trances duros, los
señoritos invocan la patria y la venden; el pueblo no la nombra siquiera, pero
la compra con su sangre y la salva. En España no hay modo de ser persona
bien nacida sin amar al pueblo.»
Antonio Machado
Só conheço espanhóis desses; dos melhores. Fico feliz por sabê-los bem, apesar
da tristeza e do choque.