sexta-feira, 8 de agosto de 2025


O cheiro limpo dos lençóis apenas uns segundos antes do despertador. E nesses segundos, o silêncio denso e seco que prolonga o vazio do meu sono de morte: nem uma memória, um sobressalto, o mais breve bulir de um sonho. O que diria Freud do meu sono uterino, que me devolve inteira ao princípio de mim?

Um vazio branco e limpo como os lençóis onde me abrigo. Nem sequer o clamor estrídulo das gaivotas. Parece-me haver cada vez mais, e suporto-as cada vez menos. Poderia facilmente abater aquelas duas, aninhadas no telhado defronte. Às vezes tenho maus pensamentos pela manhã. Para me redimir, regresso à estrada de ventre ondulado, até ao cimo da serra, para ver o meu mar longe de casa. Conto-te, com vagar e rigor, tanto e quase nada, ao ouvido do vento leve e fresco dos últimos dias. Solto-te sobre o vazio nascente e deixo-te partir.