terça-feira, 20 de novembro de 2018

Desgraças que nos confundem

A estrada ruiu entre Borba e Vila Viçosa e, na ruína, arrastou uma retroescavadora e dois automóveis e a morte de, pelo menos e de momento, duas pessoas. Também há desaparecidos, feridos, possivelmente, mais mortes e, como habitualmente, todas as críticas a uma desgraça anunciada. Começa, mais uma vez, o circo de especialistas e contra-especialistas que, muitas vezes, na posse das mesmíssimas informações, conseguem a extraordinária proeza de tirar conclusões completamente antagónicas. Eu sei que é possível. Na última reunião de condomínio a que assisti, e também a propósito de umas obras, uma advogada dizia a outro condómino presente: “não preciso de ver (um parecer jurídico que aquele lhe tentava mostrar); amanhã, podia entregar-lhe outro a dizer exactamente o contrário”. Incrível, não é? Se há testemunhos da fragilidade do estado da estrada, também há quem garanta a sua perfeita segurança. Como se viu.

Depois da tragédia, das mortes estúpidas, banais, insignificantes, uns senhores mais ou menos doutos e mais ou menos engravatados vêm (mais hão-de vir) tentar explicar o inexplicável; outros tantos, fazer o jogo do eu avisei. Toda a gente via e sabia e ninguém quis ver o suficiente e nem saber de mais nada. Morre-se tantas vezes por incúria, por ignorância, por incompetência, por despachos assinados das nove às dezasseis, por falta das verbas que parecem nunca falhar na hora de renovar frotas e gabinetes dos representantes da nação espoliada. Não será comparável, mas é nos detalhes que ele costuma estar. Os infortúnios mais ou menos previsíveis, principalmente os alheios, podem sempre esperar por dias melhores. No caso deste, a contagem ia, pelo menos, em 4 anos. Teria ou não sido evitável este acidente? Vamos ter o direito a conhecer alguma verdade, a pedir responsabilidades, se as houver?

Nos próximos dias, abrir-se-ão inquéritos, pedir-se-ão relatórios e exigir-se-ão, eventualmente, demissões. Ou não. Há desgraças mais merecedoras do que outras. É provável que o nosso popular Presidente venha reconfortar os familiares das vítimas, exigir respostas e prometer justiça doa a quem doer. Dói sempre aos mesmos e nunca ninguém tem culpa.

Há cerca de oito meses, a revista Visão denunciava uma situação de urgência na execução de trabalhos de manutenção da Ponte 25 de Abril, cuja segurança podia estar em causa. O LNEC avisava o Governo que, na ausência de obras, poderia vir ser necessário restringir-se o tráfego de pesados e de comboios de mercadorias, na ponte. O mesmo LNEC veio, depois do alarme que a notícia gerou, sossegar-nos, não era bem, bem uma questão de risco, de colapso iminente. Era uma necessidade um pouco mais que poucochinha. Pelo sim, pelo não, foi anunciada, na altura, uma verba de 18 milhões de euros para proceder a obras urgentes. Que não começaram ainda. Vejamos se a urgência, que tanto se apregoa e sempre se atrasa, chega a tempo de prevenir outra calamidade.