sábado, 23 de julho de 2022

Silly Season, e outros impropérios

Não é que eu deteste o Verão. Detesto o calor de Verão, o Inferno dos incêndios de Verão, a luz escorrente e baça de Verão, as cores mortiças e o ar obeso que me sufoca como uma mortalha de aço. Mas gosto de algumas noites de Verão. Do fim de praia, da areia morna quando o Sol, finalmente, sossega, e do gin tónico gelado com uma rodela de limão. Demasiado vulgar, talvez, mas o meu Verão é melhor assim.

Também gosto do tempo de Verão. O do relógio. Uma transição electrónica entre dois níveis de energia num átomo de césio-133, nove milhares de milhões cento e noventa e dois milhões seiscentos e trinta e um milhares e setecentas e setenta oscilações completas num segundo, todos os segundos de um dia, qualquer dia de qualquer estação, mesmo que os segundos me pareçam sempre mais lentos no tempo que dura o Verão, suponho que como deva ser, para poder desperdiçá-lo sem remorso.

De todas as silly coisas que a desdita season tem, a mais esdrúxula ouvi-a ontem: Pedro Abrunhosa cantou “Vladimir Putin, go fuck yourself”, num concerto em Águeda, e a embaixada russa em Portugal emitiu um comunicado para dizer da indignação russa e da indignidade de um homem da cultura, cujas palavras “foram (ali) ouvidas” e “respectivas conclusões serão tiradas”.

Devia servir-me de consolo a evidência: o calor de Verão ameaça outras razões, não apenas a minha.