sábado, 22 de março de 2025


Aqui, a Terra ainda não parou de rugir. O vento ainda uiva por entre as frinchas da chuva, e sou capaz de jurar que as paredes continuam a ranger em agonia.

Passei há pouco pelas ruas de árvores mutiladas. São dezenas. As que se mantêm de pé estão despidas e baças; os ramos que sobram, como esqueletos agitando-se freneticamente contra um céu de fim-de-mundo. As que jazem ainda por recolher parecem ter sido arrancadas à mão. É desolador. O vizinho do quarto andar lamenta-se com espanto, mas se eram árvores de cem anos!, dizem que foi da direcção do vento... Talvez. A quem olha agora a aparente superficialidade e fragilidade daquelas raízes desfiadas parece mais espantoso terem-se mantido de pé até há dois dias. A mim parece-me.

Há sempre uma certa solenidade na revelação furiosa da Natureza, no silêncio quieto que sobra sobre os escombros.