A
irlandesa sentada a almoçar no lugar ao lado do meu não acredita que eu tenho
um filho de 18 anos: what?!, that´s insane!, i´m shocked!, e outros
impropérios. É irredutivelmente vegan e mais ou menos pró-clima, vive num barco
ancorado no Tamisa com o namorado português, ponderam vir viver aqui, a seu
tempo, mas no way pensar em ter filhos. Eu percebo. Eu própria não
acredito que tenho um filho com 18 anos e mais uns poucos de meses, mas tenho.
É o meu maior feito. Não apenas meu, mas ainda meu. É leal, curioso, assertivo,
de um pragmatismo exasperante, de um tempo que não é este, tem um sentido de
humor apurado e moderadamente cínico – espero que o suficiente para resistir a
este mundo trágico. Tornou-se muito mais do que eu fui tentando ensinar, e emociona-me
vê-lo sair do meu colo, ser além de mim. Votará este ano pela primeira vez – porque
quer e porque pode. Não recordo alguma vez ter desistido de votar. Quando foi
tempo, levei-o comigo, primeiro no carrinho de bebé, depois pela mão,
minúsculo, autárquicas, legislativas, presidenciais, europeias, sempre, até ao limite. Será
uma liberdade relativa, essa de poder ir às urnas fingir que ainda temos na mão
o destino do país, quando, por actos e omissões, consentimos em entregá-lo aos
impostores do costume, mas parece-me mais insuportável desistir. Nunca fui
capaz de perceber quem abdica desse enorme privilégio, o voto, embora,
confesso, nesta eleição em particular esteja quase quase a considerar menos irracional
virar as costas: votar para mudar a banha ou para mudar a cobra? Mas devo-o,
sobretudo, ao meu filho: acreditar que pelo voto podemos mais, e que não votar
é uma traição maior à esperança, se não para hoje, para as tempestades que se adivinham.