segunda-feira, 22 de dezembro de 2025

Dos meus caprichos

Não sei se serei a única leitora que não escolhe livros pela sinopse, mas nunca escolho livros pela sinopse; ou não me lembro de alguma vez. Escolho livros pela capa, pelo título, pelo autor ou pelo país de origem, por uma frase que li ao acaso ao abrir um volume, e por último, resolutamente por último, pelas recomendações ou prémios, onde residem as maiores das minhas desilusões. Foi assim que cheguei (e pereci) ao meu primeiro livro da nova dama do noir espanhol. Dizem.

O tempo é de conciliação e tolerância, devia calar-me, mas há muito tempo que não lia nada tão saturado de lugares-comuns, das duas irmãs apaixonadas pelo mesmo homem, à adolescente que tem um caso com o amigo do pai. Et cetera, que aquilo cumpre todas as máximas.  Há uma insistência tão óbvia em explicar e mostrar, que sobra pouco à imaginação: o assassino materializa-se nas entrelinhas sobrelotadas. Mas, como dizia alguém há tempos, se é tão fácil, por que não fazem; e se não faço, por que critico?

Já o de Susana Araújo, que escolhi pela capa e de quem julgo nunca antes ter ouvido falar, foi um prazer. 


sexta-feira, 19 de dezembro de 2025




Gosto tanto desta canção. Já contei, não já? Um daqueles encontros felizes; talvez porque breves.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2025

 

… e eram tão verdes os azevinhos, de lustro tão liso e frio, que a luz reflectida nas suas folhas lacadas criava a ilusão de pequenas camadas brancas ovaladas de neve, que logo desapareciam quando me aproximava, o espanto quebrado no desvio angular.


quarta-feira, 17 de dezembro de 2025


O mundo que me habituei a habitar converteu-se numa distopia, orgânica, que observo fora de mim. Dispo a pele que me contém e pairo sobre este ninho de cucos, de víboras, observando o caos. Deus está morto, não há profeta que nos redima. Sinto-me enganada porque acreditei que éramos melhores; acreditei que a liberdade seria sempre um ponto de apoio onde alavancar a Democracia. Mas a liberdade também pode escolher ressuscitar as suas próprias tragédias; e por despeito, não apenas por medo, pela miséria ou pela humilhação: por despeito, consciente do horror. O povo deixou-se enfastiar. A complexidade, a dúvida, a responsabilidade. O livre pensamento. Enfastiou-se da lucidez. Farto, ruma à vala comum, salivando sob a sineta do dono, com a voragem dos curiosos ante os desastres, não para levar ajuda, mas para beber da ruína. Vai vencendo um cansaço acre, disfarçado de revolta, que encontra prazer em ver arder o que não compreende e detesta. A democracia é frágil, exige cuidado, tempo, e o tempo morre no agora. Eu sou apenas recusa.



domingo, 14 de dezembro de 2025

Raquel Soeiro de Brito, 100 anos

O jornalismo também se faz de boas conversas. 

"Tenho visto muitas coisas, mas com perigo iminente à minha frente, a uma distância como estou de si, foi só com este vulcão. É como um toureiro diante de um touro, que passa com a capinha e está mesmo nos cornos do touro. É uma sensação absolutamente de fascínio. Estava com a câmara virada e houve uma explosão lindíssima. Espantosa. Com aquela impetuosidade, houve uma quantidade de explosões que duraram quatro horas seguidas. Eu não tirava os olhos. Não podia sair, a ponto de os bombeiros pegarem em mim debaixo dos braços e me levarem."


Salvador Fernandes/Fototeca do CEG-IGOT da Universidade de Lisboa


sábado, 13 de dezembro de 2025

domingo, 7 de dezembro de 2025





quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

(Outras) Declarações sem Interesse Nenhum

 

Gosto do Natal. O meu Natal é de sorrisos e mimos e colo e abraços demorados, e, nisso, não é diferente de muitos outros dias do meu ano, e por isso sou grata, embora não o verbalize com o despudor que merecia. Talvez o meu Natal sirva esses pequenos excessos: agradecer o tempo que não perco em discussões familiares sobre, nem em dias inteiros, insanos, de centro comercial, em filas intermináveis para a compra de presentes estéreis.

Depois, há um bacalhau cozido, que não é exactamente com todos, mas não dispensa uma generosa cama de azeite, muito alho picado directamente no prato e um pouco de pimenta (que eu prefiro preta), manjar que a família herdou da mania do pai do meu pai, Natal após Natal.

Há (não é inevitável?) muita saudade, no meu Natal, mas há também, ainda, uma alegria de miúda que guardo no fundo de mim como o mais precioso dos bens, e é sempre esse o meu maior desejo para aqueles a quem quero bem, um breve pulsar de alegria para aguentar a face miserável do mundo.





 

quarta-feira, 3 de dezembro de 2025

Sete Pecados Mortais


Soberba  Paraíso Perdido, John Milton

AvarezaA Sibila, Agustina Bessa-Luís

Luxúria  Madame Bovary, Gustave Flaubert

Inveja  Otelo, William Shakespeare

GulaOs Buddenbrook, Thomas Mann

IraA Ilíada, Homero

Preguiça - Oblómov, Ivan Gontcharov


...em (permanente) actualização...


terça-feira, 2 de dezembro de 2025

 


"And in the end the burgesses passed that remarkable law which is told of by traders in Hatheg and discussed by travelers in Nir; namely, that in Ulthar no man may kill a cat."

The Cats Of UltharH.P. Lovecraft



Doentio...

 

Onze bombeiros indiciados por violação de um jovem colega sob pretexto de uma praxe.

Dez militares da GNR e um agente da PSP suspeitos de agirem como mercenários, intimidando e agredindo imigrantes explorados e a trabalhar em condições indignas.

O empresário V.M (quem?), que mandava agredir, e se gaba de ter na mão militares da GNR, agentes da PSP e uma procuradora do Ministério Público.

Saem todos em liberdade depois de o Tribunal Central de Instrução Criminal concluir pela "inexistência de indícios dos crimes imputados pelo facto de não ter validado as escutas telefónicas, que não tinham sido transcritas".


segunda-feira, 1 de dezembro de 2025

 

A primeira vez que vi Guernica ao vivo, o mural ocupando praticamente toda a parede da sala que lhe é dedicada no Museu Rainha Sofía, fiquei atordoada. A própria dimensão do quadro é violenta; magnética. É demasiado. Movemo-nos por dentro daquela devastação, somos outro cinza, outra sombra sobre aquele labirinto de destroços, e nenhuma distância é confortável: torna-se quase físico, como se, por momentos, mais do que observá-lo, o habitássemos na sua brutalidade tridimensional. 

Não sei até que ponto Pablo Picasso se sentiria homenageado pela arte de Carlos Rodríguez no seu Eterno. Gostei muito da primeira parte, e muito pouco da segunda – essa, supostamente, mais dentro da ousadia de Picasso. Mas a minha relação com a arte, qualquer forma de arte, é puramente instintiva, animal. Se me arrasta, se me fere, se me alegra; não sei nada depois disso.